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ANÁLISE E PRODUÇÃO DE TEXTO MÓDULO 1
ANÁLISE E PRODUÇÃO DE TEXTO MÓDULO 1

LEITURA E ANÁLISE DOS PROCESSOS LINGUÍSTICOS EM LÍNGUA PORTUGUESA

 

 

 

Práticas de linguagem e PCN: o ensino de língua portuguesa

 

 

Os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) apresentam propostas de organização de conteúdos e delimitação de objetivos que visam à formação dos alunos como coautores do conhecimento, não somente reproduzindo terminologia gramatical – tal qual se vê no ensino mais tradicional-, mas principalmente fazendo com que os alunos reflitam sobre sua língua. Neste sentido, o ensino de português só faz sentido com base em textos orais e escritos, buscando uma interação entre leitura, produção textual e análise linguística.

Embora seja importante que os alunos conheçam terminologia gramatical e norma culta – o professor precisa mostrar como se usa a língua, em que contexto se opta por uma ou outra construção. Essa abordagem que considera a diversidade de textos – lidos/ouvidos e produzidos pelos alunos – e as situações concretas de comunicação, pode colaborar efetivamente para desenvolver a competência linguística dos educandos, objetivo principal de língua portuguesa.

Quando se defende uma abordagem textual, entra em questão o uso de textos como unidade de ensino, e não como mero pretexto para usos gramaticais. O texto como unidade de ensino pressupõe um trabalho que congregue as três práticas de linguagem apresentadas nos PCNs: práticas de leitura de textos orais/escritos, prática de produção de textos orais/escritos, pratica de análise linguística. Somente relacionando uso-reflexão-uso é possível pensar um ensino de língua portuguesa produtivo, em que o aluno passe da condião de aprendiz passivo para a de alguém que constrói seu próprio conhecimento – com a ajuda do professor- por observar o funcionamento da estrutura da língua nos mais diversos gêneros textuais, lidos e produzidos por ele.

 

TEXTO, COESÃO E COERÊNCIA                         

 

                                         

O texto é elemento de interação, marcado pela coesão entre seus elementos e pela sua coerência interna/externa. O texto é “qualquer expressão de um conjunto linguístico num ato de comunicação... tematicamente orientado e preenchendo uma função comunicativa reconhecível.

Coesão e coerência estão intimamente ligadas, pois dependem do conhecimento de mundo do leitor e da sua capacidade de decifrar as ligações existentes entre os componentes linguísticos. A coerência está na relação entre o texto e o leitor em uma significação de leitura. Coesão e coerência inter-relacionam-se, e a capacidade textual do leitor faz com que ele consiga observar essas relações no texto, possibilitando sua compreensão/interpretação. Formamos leitores quando mostramos como os elementos presentes no texto colaboram para a construção de sentido.

Texto 1: Passaram os dois

Chile perde para a Espanha, termina em segundo e será o rival do Brasil. Time de Bielsa  foi ousado, mas apresentou erros fatais.

 

                O Chile foi derrotado por 2 a 1 pela Espanha. Perdeu a liderança do Grupo H para o rival , mas foi beneficiado pelo empate da Suiça em Honduras. Avançou em segundo lugar e será o rival da Seleção Brasileira nas oitavas de final da Copa do Mundo.

            Resta saber qual a estratégia que os Locos de Bielsa terão contra os brasileiros. Afinal, eles são capazes de tudo. Nas duas primeiras rodadas se lançaram ao ataque e venceram sem discussão Honduras e Suiça. Ontem encarando uma Espanha, que pela primeira vez teve seus quatro ases desde o início (Xavi, Iniesta, Villa e Torres), trataram de sufocar o rival , mesmo só precisando do empate para avançar sem tomar conhecimento do jogo suíço.

           Mas apesar de toda sua estratégia ousada – desta vez cinco jogadores focados no ataque -, o Chile mostrou deficiências que foram fatais e que devem ser bem observadas por Dunga e pela comissão da Seleção.

            Uma delas: a marcação é muito viril e isso ocasiona um caminhão de cartões. Tanto que o time tinha oito pendurados ontem. E antes dos vinte minutos, Medel, Ponce e Estrada estavam amarelados. Aliás, o Chile foi a única seleção que fez 20 ou mais faltas em todos os seus jogos.

            Mais: o frenético toque de bola gera erros de passes que geram contra-ataques. Foi assim aos 24. Valvídia errou, a Fúria ligou o contra-ataque para Fernando Torres pela esquerda, com apenas um na marcação. Isso fez o goleiro Bravo sair atabalhoadamente para a dividida que sobrou para Villa chutar da intermediária, de primeira, num lance de beleza e precisão. [...]

(Fonte: VIEIRA, Carlos Alberto. Passaram os dois. Lance, Rio de janeiro, 26 jun. 2010, p.20.)

Neste relato esportivo, os termos sublinhados colaboram para a compreensão do texto, mas dependem de um leitor atento, e de preferência do que acontece no futebol.

Time de Bielsa e Locos de Bielsa – referem-se ao jogadores do Chile.

Eles – chilenos

Fúria – seleção espanhola

Rival e estratégia ousada (maneira como os jogadores preparam seu jogo) – usamos termos do campo semântico da guerra em textos sobre esportes, neste caso o leitor acompanha o relato esportivo: como uma batalha.

Utilizamos os termos referenciação e sequenciação.

Referenciação – para compreender o texto, é necessário relacionar os elementos de retomada à construção de sentidos.

Sequenciação – Realiza-se por meio de encadeamentos (uso de operadores argumentativos – e, mas, portanto etc.); por meio de repetição de palavras e expressões (recorrência de termos), estruturas(paralelismo) e conteúdos semânticos(paráfrases); por meio de progressão temática.

Texto 2: Eu sei, mas não devia      

Eu sei, mas não devia

Marina Colasanti


Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma. (1972)

 Neste texto, encontramos:

  • Encadeamentos (usos de operadores argumentativos): o uso contínuo de “E” indica uma adição frenética. “Mas”, no início da crônica, mostra a oposição entre “A gente se acostuma” e “não devia”[se acostumar}.
  • Repetição de palavras e expressões (recorrência de termos): “a gente” e com quase todos os inícios de frase, que retomam o final da anterior.
  • Repetição de estruturas (paralelismo): há paralelismo quando estruturas semelhantes ou idênticas são repetidas, geralmente, com efeito estilístico. É o que vemos nas exaustivas repetições de “A gente se acostuma”, que iniciam os parágrafos, e nas estruturas do penúltimo parágrafo (“Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. [...]”), em que há paralelismo marcado em “Se x, a gente faz y”.
  • Progressão temática: as retomadas de cada final de frase na frase seguinte e as recorrências de termos e estruturas colaboram para a progressão temática (costumes da vida moderna) ao longo de todo o texto.

Como percebemos, a coesão e coerência inter-relacionam-se, e a capacidade textual do leitor faz com que ele consiga observar essas relações no texto, possibilitando sua compreensão/interpretação e assim colaborando para a construção de sentido.

 

O texto como unidade de ensino

 

Para compreender certos textos, é necessário observar outras linguagens além da verbal. Por exemplo uma tirinha, temos que enfatizar a relação imagem/texto verbal, que confere humor às tirinhas. A intertextualidade presente nas tirinhas. O ensino de textos precisa englobar aspectos variados, como o suporte onde ele circula, o gênero textual a que pertence, a tipologia textual predominante, considerando elementos verbais e não verbais constituintes desse texto, além da interação entre interlocutores. O objetivo dessa abordagem é a formação de leitores e produtores críticos, com conhecimentos linguísticos e textuais suficientes para serem cidadãos, leitores do mundo.

Texto 3: Tirinha do Cascão

 

                       

(Fonte: Disponível em: <https://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=8697 > . Acesso em: 20 jun. 2014.)

 

Texto 4: Tirinha da Magali

 

     

 

(Fonte: Disponível em: <https://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=8697 > . Acesso em: 20 jun. 2014.)

Se tivéssemos que segmentar essas tirinhas, teríamos o texto verbal das falas dos personagens, o não verbal – representado pelo cenário, pela expressão das personagens e pelo que estão fazendo – e a tirinha como um todo constitutivo, ou seja, como um texto. Logo, precisamos compreender que a junção de palavras e frases, apenas, não constitui um texto: ele precisa ser aceito como tal; o sentido precisa ser construído. E isso fazemos quando ultrapassamos a superfície linguística e entramos numa análise textual e discursiva.

Assim, o ensino de textos precisa englobar aspectos variados, como o suporte onde ele circula, o gênero textual a que pertence, a tipologia textual predominantemente, considerando elementos verbais e não verbais constituintes desse texto, além da interação entre interlocutores.

 

 

TIPOLOGIA E GÊNEROS TEXTUAIS  

 

Para lermos m texto e compreendê-lo, precisamos considera-lo um todo significativo, identificando a que gênero pertence e, também, que tipologia textual predomina na sua construção. Ao compreendermos as estratégias linguísticas utilizadas, relacionando-as ao gênero e à tipologia, refletimos sobre a língua e entendemos como se constitui o texto, ou seja, fazemos a interação entre leitura, produção textual e análise linguística sugerida nos PCNs.

O conceito de gênero textual é importante porque o texto só existe situado social, cultural e historicamente. Quando lemos uma receita fazemos uma série de associações conforme nosso conhecimento prévio do que é uma receita, qual o seu objetivo, em que situação é usada, como se organiza linguisticamente. Isso não significa que todas as receitas serão iguais, mas há semelhanças de forma e conteúdo que fazem com que, diante de uma receita, saibamos perfeitamente que ela não é uma bula ou bilhete.

Os gêneros, quanto aos aspectos composicionais, caracterizam-se por:

Estilo – diz respeito à seleção de palavras, expressões e tipos de frases mais comuns e o modo de organizá-las; o seja, aos aspectos gramaticais e lexicais principalmente.

Conteúdo temático – o que é/pode ser dito naquele gênero;

Estrutura – refere-se às tipologias textuais (narração, argumentação etc.) e as partes constitutivas de cada gênero.

Deve-se, ainda, observar os seguintes aspectos:

Tema/intencionalidade – objetivo principal daquele texto, que o constitui como tal;

Circulação – suporte no qual o texto costuma circular, porque isso também colabora com sua caracterização;

Interlocutores- participantes da situação comunicativa;

Estratégias linguísticas – marcas linguísticas mais comuns ao gênero

 

Há textos que apresentam uma configuração híbrida, evidenciando o que  Marcushi (2002) define como “intertextualidade intergêneros”: uma mescla de funções e formas. Nesse caso, um gênero pode assumir características de outro.

Texto 5: Receita de bolo de cenoura formigueiro

Ingredientes:

Massa

  • 1 xícara (chá) de óleo
  • 1 xícara (chá) de cenoura crua
  • 3 ovos
  • 3 xícaras (chá) de farinha de trigo
  • 2 xícaras (chá) de açúcar
  • ½ xícara (chá) de chocolate granulado
  • 1 colher (sopa) de fermento em pó

 

Ingredientes para a cobertura

  • 2 xícaras (chá) de leite
  • ½ xícara (chá) de chocolate em pó
  • 2 xícaras (chá) de chocolate granulado para cobrir
  • Alumínio para embrulhar

1 hora

16 porções

Bata no liquidificador o óleo, a cenoura e os ovos. Depois de bem batido, coloque em uma tigela e acrescente a farinha, o açúcar, o chocolate granulado e o fermento. Misture bem. Coloque a massa em uma assadeira e asse em forno médio pré- aquecido (180ºC) por 35 minutos. Após assado e frio, corte o bolo para molhar e passar no chocolate granulado.

Cobertura

Numa panela, amorne o leite com o chocolate e o açúcar. Deixe esfriar. Passe rapidamente as laterais do bolo na calda e depois no chocolate granulado. Embrulhe no papel alumínio.

(Disponível em: https://receitas.eduguedes.com.br/bolo-de-cenoura-formigueiro/>. Acesso em; 20 jun. 2014.)

 

Texto 6: Receita de coelho á portuguesa*

            O coelho da América é similhante ao coelho silvestre da Europa, e portanto, proporciona os mesmos guisados, que se obtêm com este. A sua carne é mais gostosa durante os mezes de dezembro a Junho; nos outros mezes, porém, a sua carne é muito dura e magra.

 

Coelho á portuguesa

            Corta-se um coelho em pedaços, fervem-se em água, vinho, sal, salsa, Mangerona, noz moscada.

            Por outro lado, corta-se em rodellas uma porção de cebolas que se põe em uma cassarola com duas colheres de gordura de azeite doce, sal e pimenta; principiando a ferver ajuntão-se uma colher de vinagre e outra de caldo, não mexendo-se para que as cebolas fiquem inteiras ajunta-se, n’esta ocasião, o coelho cozido, aquece-se e serve-se.

(Fonte: O cozinheiro nacional, segundo livro de culinária publicado no Brasil, por volta de 1875, e primeira tentativa de documentar uma cozinha que usasse ingredientes só nossos: anta, cará, cobra, mandioca, paca, papagaio, peru, rã, tanajura. Seus propósitos são definidos na própria abertura do livro: É tempo que este país se emancipe da tabela europeia debaixo da qual tem vivido até hoje.)

*Respeitou-se a grafia original desta receita, publicada em folheto distribuído durante a Exposição 100 anos da chegada da Família real no Brasil ao Rio de Janeiro (Sesc-Flamanego/RJ,2008).

Texto 7: Receita de torta de nozes

... uma torta de, de nozes que essa é de, de encher a boca d’água. Moem-se as nozes, digamos, meio quilo de nozes, para meio quilo de nozes, quer dizer, com casca, se você quiser pode dobrar. Você põe, ba... mói as nozes, junta a essas, eh, antes disso, você deixa as nozes moídas, você bate claras, você, meia dúzia de, de ovos, essa meia dúzia de ovos você bate as claras, junta as gemas, junta o açúcar, e depois de tudo isso misturado então, é que você adiciona as nozes, sendo que quan... para meio quilo de nozes depois de raladas você acrescenta duas colheres, no máximo três, eu geralmente ponho só duas, de farinha de rosca. E não bate propriamente, mistura, mistura, leva ao forno para fazer, no caso com meio quilo, serão duas camadas e três camadas finas, quer dizer de, vamos dizer, estreitas, hum? Corta de maneira a poder dar três camadas e entre essas duas camadas, ah, coloca-se a ba... a baba-de-moça, que é feita com, ah, uma proporção, digamos, de uma xícara d’água para duas de açúcar, e três a quatro gemas, dependendo do tamanho do ovo. Essa gema vai se colocando, depois que se colo... consegue o ponto quase de fio, quando está se aproximando do ponto de fio, mistura-se um pouquinho desta calda nas gemas, e aos poucos vai-se pingando isto, e mexendo. A única dificuldade nesse, nessa torta é a baba-de-moça, porque se a gente se distrair, se o fogo estiver forte demais, tem que ser forno brando, fogo brando, que é pra ir desmanchando aos pouquinhos e não, vamos dizer, e conseguir uma, um cremezinho, uma superfície lisa. Deixa-se, retira-se, deixa- se esfriar um pouco e coloca-se entre as camadas do bolo, que foi feito também, por sua vez, em fogo brando. Leva mais ou menos uns vinte minutos, meia hora no máximo. Agora, para que fique bem gostosa, a gente espeta com uma faca, então a, a camada vai, do bolo, vai, a camada da torta vai absorvendo, de modo que quando se coloca a segunda e se faz a mesma coisa, quando, recobre-se, o coberto pode ser de chocolate, em geral eu faço um coberto branco, feito com nozes e feito com, geralmente é um bolo, tipo de torta de natal, né? Enfeita-se com sininhos e coisas típicas de natal, de modo que quando se corta, que ela, a massa absorveu a baba-de-moça, então, é uma coisa de delicioso mesmo. Isso é uma das coisas mais gostosas que eu sei fazer em matéria de, de bolos.

(Fonte: PROJETO NURC rj. Inquérito DID 0253. Disponível em: https://www.letras.ufrj.br/nurc-rj/corpora/did/did_253.htm>. Acesso em 20 jun. 2014.)

As receitas 5 e 6 foram escritas em épocas diferentes; já o texto 7 é uma receita oral. Porém, os três apresentam semelhanças em relação aos seguintes aspectos:

  • Estrutura: tipologia predominantemente injuntiva (objetivo principal de indicar procedimentos a serem seguidos), apresentam ingredientes e quantidades geralmente em forma de itens (eventualmente, pode haver ilustrações para facilitar a compreensão das instruções);
  • Intenção do texto (ensinar a fazer algo): por terem uma finalidade didática de ensinar de maneira simples e eficiente, as receitas costumam ser objetivas, os comandos não são questionados.
  • Marcas linguísticas predominantes: verbos com modo imperativo (pode ser usado, por exemplo, o infinitivo: “juntar”, “mexer” etc.); referência ao leitor, às vezes por meio de “você”; expressões usadas especificamente em receitas, como “a gosto”, “à vontade”; expressões adverbiais, principalmente de modo e tempo (bem, aos poucos, depois etc.).

Apesar dessas semelhanças, mesmo sendo receitas, os três textos são diferentes: o mais protótipo é o 5, com ingredientes e modo de preparo bem delimitados, detalhes de quantidade de ingredientes, sequência organizada de procedimentos; o texto 6, do século XIX, não indica quantidade de ingredientes e começa diretamente com o modo de preparo, mas se inicia com considerações gerais sobre o coelho que substitui a lebre na receita europeia original; já no texto 7, oral, além de não indicar quantidade de todos os ingredientes, também não seguir uma ordem de procedimentos em todas as etapas. Embora tenham sido produzidos em épocas e modalidades diferentes, com diferenças estruturais, os três textos apresentam semelhanças relevantes que nos permitem classifica-los como exemplos do gênero textual receita.

Os gêneros são tipos de enunciados relativamente estáveis, situados sócio historicamente, com intencionalidade bem definida e relevante para um determinado grupo social.

 Texto 8: Receita de pão

RECEITA DE PÃO

 

 

é coisa muito antiga

o ofício do pão

primeiro misture o fermento

com água morna e açúcar

e deixe crescer ao sol

 

depois numa vasilha

derrame a farinha e o sal

óleo de girassol manjericão

 

adicionado o fermento

vá dando o ponto com calma

água morna e farinha

 

mas o pão tem seus mistérios

na sua feitura há que entrar

um pouco da alma do que é etéreo

 

então estique a massa

enrole numa trança

e deixe que descanse

que o tempo faça a sua dança

 

asse em forno forte

até que o prefume do pão

se espalhe pela casa e pela vida

 

 

(Fonte: MURRAY, Roseana. Receitas de olhar. São Paulo: FTD , 1997, p.28.)

            O texto 8, apesar de trazer elementos básicos de uma receita, apresenta objetivos estéticos de um poema e uma característica estrutural marcante deste: o verso. Além disso, o final (“até que o perfume do pão/ se espalhe pela casa e pela vida”) marca uma subjetividade incomum em receitas. Assim, podemos classificar esse texto como um poema que brinca com a estrutura de uma receita.

 A especificidade dos gêneros textuais orais

 

Os professores devem trabalhar textos orais espontâneos em sala de aula, para que os alunos compreendam como se organizam – bate papo, entrevistas, conversas telefônicas etc. além disso, é importante também trabalhar seminários, debates e outros gêneros orais mais planejados.

Algumas características:

 Trocas de turnos- toda vez que um interlocutor toma a palavra.

Marcadores conversacionais -  (hum? Né? Aí, bem..) colaboram para repensar o que se está falando, para introduzir ou finalizar o turno.

Hesitações – (que é feita com, ah...) repetições (essa é de , coloca-se a ba... bafa de moça...) correções (você põe...)

Digressões – ocorre quando há uma fuga do tema principal, costuma logo depois retomar o tópico principal logo em seguida.

Retextualização – a alteração de um texto oral ou escrito para outro formato , oral ou escrito.

 

 

TIPOLOGIAS TEXTUAIS

 

Os textos são predominantemente organizados conforme uma tipologia, porém em geral mais de uma aparece na constituição deles.

TIPOLOGIA TEXTUAL: NOMENCLATURA SIMPLIFICADA E ADAPTADA

CARACTERÍSTICAS DAS TIPOLOGIAS

1-      DESCRIÇÃO

2-      NARRAÇÃO

3-      EXPOSIÇÃO

4-      ARGUMENTAÇÃO

5-      INJUNÇÃO

OBJETIVO E TEMÁTICA

1-      IDENTIFICAR, LOCALIZAR E QUALIFICAR SERES, OBJETOS, LUGARES, APRESENTANDO CARACTERÍSTICAS físiscas ou psicológicas.

2-      RELATAR FATOS, ACONTECIMENTOS, AÇÕES, NUMA SEQUÊNCIA TEMPORAL.

3-      DISCUTIR, INFORMAR OU EXPOR UM TEMA, NUMA ORGANIZAÇÃO LÓGICA, MOSTRANDO RELAÇÕES DE CAUSA/EFEITO, CONTRAPOSIÇÃO ETC.

4-      DEFENDER PONTO DE VISTA, OPINIÃO, POR MEIO DE ARGUMENTOS, NUMA ORGANIZAÇÃO LÓGICA, MOSTRANDO RELAÇÕES DE CAUSA/EFEITO, CONTRAPOSIÇÃO ETC.

5-      DAR ORDENS, APRESENTAR REGRAS E PROCEDIMENTOS A SEREM SEGUIDOS.

MARCAS LINGUÍSTICAS DE DESTAQUE

1-  SUBSTANTIVOS, ADJETIVOS E ADVÉRBIOS (MODO E INTENSIDADE, PRINCIPALMENTE); VERBOS NO PRESENTE OU PRETÉRITO IMPERFEITO DO INDICATIVO.

2-   VERBOS, ADVÉRBIOS E CONJUNÇÕES(TEMPO, LUGAR...); VERBOS NO PRESENTE OU PRETÉRITO PERFEITO DO INDICATIVO.

3-     OPERADORES DISCURSIVOS (CONJUNÇÕES, PREPOSIÇÕES E EXPRESSÕES DENOTATIVAS), MODALIZADORES (EX.: TALVEZ, SEM DÚVIDA,PROVAVELMENTE ETC.) VERBOS NO PRESENTE DO INDICATIVO.

4-     OPERADORES DISCURSIVOS (CONJUNÇÕES, PREPOSIÇÕES E EXPRESSÕES DENOTATIVAS), MODALIZADORES (EX.: TALVEZ, SEM DÚVIDA,PROVAVELMENTE ETC.) VERBOS NO PRESENTE DO INDICATIVO.

5-     VERBOS COM VALOR IMPERATIVO (MESMO QUE NÃO ESTEJAM NO MODO IMPERATIVO, MAS NO INFINITIVO, POR EXEMPLO), PRONOMES (VOCÊ, VOCÊS).

O MATERIAL PRODUZIDO E LIDO PELOS ALUNOS FAZ PARTE DE UMA SITUAÇÃO DE INTERAÇÃO, PRESSUPÕE UM INTERLOCUTOR E TEM UMA FINALIDADE.

É na análise, mesclando características dos gêneros textuais e das tipologias, observando como se constituem os textos e que aspectos coesivos se destacam, que podemos integrar leitura e produção textual com análise linguística, como pregam os PCNs.